quarta-feira, 30 de junho de 2010

Boom-chicka-boom

Chego a casa, na noite em que o Ateneu ardeu, e num assomo de clarividência, os meus ouvidos guiam-me determinados para a melodia certeira. O disco: Johnny Cash with His Hot and Blue Guitar, a canção: Folsom Prison Blues, o momento: exactamente depois de o homem de negro desafogar este par de versos, "when i hear that whistle blowin', I hang my head and cry", quando se ergue das cinzas a guitarra de Luther Perkins no seu frémito indomável.
 

terça-feira, 29 de junho de 2010

La Albirroja


Hoje vi um jogo do mundial. Foi fantástico. Emoção e golos a rodos. Ficou 5-3, vejam lá. Descobri uma grande equipa, que joga um futebol perfumado como poucos, pleno de técnica sem nunca descurar a força, e sempre patenteando o mais perfeito domínio daquilo a que se acordou denominar por "a táctica". Conquistou-me o coração. O Paraguai passou muito justamente à fase seguinte e ganhou todo o direito a sonhar. Até contam nas suas fileiras com um jogador que para além de jogar pelo Paraguai, o que por si só completaria qualquer profissional da bola, ainda tem tempo para fazer uma perninha na equipa de uma data de amigos meus. Só pode ser boa gente. Não faço ideia com quem é que vão jogar a seguir mas vou torcer por eles.

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Capacidade negativa

"Reconheçamos a importância de não compreender uma obra de arte. Esta abre esse mundo do não-conhecimento e ajuda a garantir que não o perdemos de vista, mantendo viva a nossa curiosidade e activa a nossa especulação."

A propósito disto, que vale bem a pena. Especialmente recomendada a todos os que proclamam não ter paciência para pseudo-artistas-que-só-fazem-coisas-que-nem-eles-devem-perceber.

domingo, 27 de junho de 2010

Folk

Edward Hicks "Peaceable Kingdom" (1834)

sábado, 26 de junho de 2010

O documento

Fui finalmente ver 24 City. Já não existem momentos de ficção assumidos que vão intercalando com o registo documental no cinema de Jia Zhang-Ke. A realidade que se assoma neste filme é bem mais poderosa, é uma realidade que não se deixa limitar por aquilo que a câmera consiga encontrar, é uma realidade que funde os dois registos magnificamente para criar outra coisa, algo muito maior que um documentário, um verdadeiro "documento". Não tenho nenhumas dúvidas que daqui a uns anos alguém olhará para trás e apontará para Jia Zhang-Ke e em particular, para 24 City, como o primeiro de qualquer coisa. Completamente obrigatório.
   

sexta-feira, 25 de junho de 2010

La roja vai fazendo as maletas

Copa mesmo marada. Depois das humilhações da campeã e da vice-campeã mundial, tinha logo que acontecer isto à campeã da europa. Eu até gosto do futebol dos gajos, tem bués tiros à la puerta, mas é a vida loca da copa.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Endurance

Os eslovacos que se lixem, heróis de noventa minutos há para aí aos pontapés. Agora, de onze horas e cinco minutos só conheço um: John Isner.

quarta-feira, 23 de junho de 2010

Selvajaria

Black Mountain "Wilderness Heart"

O Rei

A Fnac anda enganada, ao pé do Bruno Morgado e do seu agrupamento musical, o Daniel Johnston não passa de um gajo doente.

terça-feira, 22 de junho de 2010

Teste o calvinismo dos outros

Você sabe que foi influenciado por um cristão calvinista quando dá por si a pensar se a melhor opção não será pôr só o texto em cima de um fundo negro.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Modo celebratório

Primeiro sms recebido pós-jogo: "O primeiro míssil nuclear norte-coreano já tem destinatário. Estamos fodidos, vamos ser os primeiros a ser varridos."

As Intermitências da Morte

Nunca a TV foi tão interessante, e não necessariamente devido às transmissões dos jogos da copa. O mérito vai inteirinho para a viciante roman-savon protagonizada por Les Bleus (nunca uma queda foi tão bela e prazenteira de se ver), e a competição entre os jornalistas portugueses para ver quem consegue introduzir mais vezes expressões como "levantado do", "ensaio sobre...", ou o já clássico "o ano da morte", nos directos do cemitério ou nas peças sobre a morte de Saramago.

domingo, 20 de junho de 2010

Supremacia do puro

Kazimir Malevich "Head of a Peasant Girl" (1912-1913)

sábado, 19 de junho de 2010

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Do mar amarelo, com amor

Eu sei que ando um bocado obcecado com a zona animada do paralelo 38, mas no meio de uma primeira jornada mundialista assim a dar para o aborrecido, tinha dado tudo para assistir à transmissão do Brasil-Coreia do Norte para a "Terra Mãe", com tradução de preferência. O estoicismo (que eles se podem dar ao luxo de exaltar em duas variantes: a monárquica e a comunista), os carrinhos em nome do "Querido Líder", o golo que não foi aquele gajo que marcou (foi claro, o "Querido Líder", ou quem sabe, o falecido pai dele, "O Presidente Eterno"), o Brasil feito os E.U.A. da bola (Lula como o diabo imperialista, portanto), e o total desconhecimento de qual teria sido o resultado do Coreia do Sul-Grécia da véspera. Mas entretanto, enquanto se espera pelo embate entre o soldados de Kim e os do prof.Queiroz, este é o livro a ler:


Rio Verde (versão remax)

Ai rio verde, o que é que eu hei-de fazer?
Se for na boa, vou aqui ao lado a ver-te correr
A sombra das tuas faias vou sorver
Não sabes que por estes dias não sou difícil de satisfazer

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Sem desculpa

Chegam-nos quase sempre com atrasos significativos mas, com a inestimável contribuição de um festival ou outro, lá se vai tendo a oportunidade de descobrir parte significativa da obra do prolífico Jia Zhang-Ke em salas cá do burgo. Depois de filmes como Unknown Pleasures, The World, Still Life, ou o último que dei por ter cá passado, Useless (no Indie há um par de anos, se não me engano), não é preciso consultar o oráculo para saber que 24 City é obrigatório. E meninas realizadoras, que andam por aí a dizer que lhes interessa cada vez mais misturar ficção e documentário, então é que não têm mesmo desculpa nenhuma para o perder.

Bad mouth strikes again

António Pascoalinho, um cocktail bem doseado de mau gosto, grosseirismo e prepotência. Um verdadeiro gigante no seu Portugal dos Pequeninos.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Tudo o que eu quero

This Is Happening precisa tanto de mais um elogio como eu de mais uma vuvuzelada, mesmo que via TV, nos ouvidos. Não que esperasse que James Murphy fosse deixar os seus créditos em mãos alheias nesta despedida, mas a minha relação com este Soundsystem tem sido sempre assim, quase que me esqueço deles e depois sou infalivelmente arrebatado a cada novo disco. É enorme, tem uma capa enorme, um lettering enorme, e malhas tão enormes, tão enormes, com arranjos e pormenores tão enormes, que nem sei como é que lá cabe tudo. Mas diabos me levem se não está tudo o que é preciso saber sobre o mel e as abelhas nesta pequena linha de guitarra.

A Descondecoração de Samuel Úria

Só para o caso de alguém andar a confundir "atenção" com "evolução". Uns regravam as mesmas músicas até atingirem a perfeição, outros fazem-nas logo assim: roque podridão.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Meia esfera e força

Esteticamente falando, não sei se vinte e dois gajos a correrem de manga comprida, luvas, e uma ou outra gola alta, corresponde completamente à fantasia colonialista de um mundial africano.

terça-feira, 8 de junho de 2010

Muitos dias tem a semana

Embora com uma pica, como há muito não tinha, para aqui escrever, voltei a (ter de) interromper a disciplina do postal diário. Desculpas há muitas e variadas, de mais uma aventura dos Picos Gémeos à falta de condições básicas no meu novo poisio, mas a mais interessante é sem dúvida a de ir acompanhar Filipe da Graça no seu debut musical de palco, quinta no cabaret Maxime a abrir para o Samuel Úria, num concerto que tem tudo para ser memorável: pelas canções "novas" que o Samuel vai mostrar e pelas malhas fresquinhas do (em breve) disco de estreia que Filipe da Graça acabou de gravar. Nunca a freguesia da Graça esteve tão bem representada no cançonetismo nacional.
Noutro formato, hoje há a curta-metragem Parte de Mim da talentosa Margarida Leitão como convidada do Shortcutz, no Bicaense, e quinta-feira chega às salas o seu novo documentário Muitos Dias Tem o Mês, que naturalmente recomendo vivamente, mas só a partir de sexta.
     

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Sugestão para a BP

Torpedo norte-coreano. Pensem nisso. É um mar de vantagens: não falha; não deixa os comentadores da CNN a noite toda desorientados a comentar umas imagens subaquáticas de uma mancha negra de petróleo onde se vê vagamente um braço mecânico de cinco em cinco minutos, a fazer ninguém sabe muito bem o quê; os chineses apoiam (e temos de agradar aos chineses, afinal de contas eles são os nossos novos donos, embora não perceba muito bem em que medida é que eles se relacionam com os chineses que eu conheço: os das lojas e os dos restaurantes, mas isso é outra estória); só os chatos do sul-coreanos é que vêm choramingar depois, e a esses ninguém percebe; Israel anda mortinha por assumir sozinha o fardo de ser a vilã mundial, portanto, o poder também não caí na rua; e a melhor parte, o assunto morre e sobra mais espaço nos jornais e TV para o campeonato do mundo (competição em que o Ronaldo e o Black Eyed Peas vão participar e que o Mourinho, inexplicavelmente, parece não ter hipóteses de abarbatar) e para o Jorge Jesus explicar como é que vai ganhar a Champions para o ano (embora aqui se aplique em parte a questão dos sul-coreanos).
     

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Ondas de choque

Por um lado, Söderling arrisca-se a ficar conhecido em Roland Garros como o gajo que mais vezes os privou da desejada final Nadal vs. Federer. Por outro lado, Björn Borg, por também ser sueco, esqueceu-se dessa sua mesma condição (a de sueco), e passou-se dos carretos, andando agora a gritar para quem o quiser ouvir que Robin "wil become world No.1 faster than we can expect". Temo que a realidade seja bem mais aborrecida, nem Söderling vai ser numero uno, nem Nadal e Federer receberam nada que não merecessem.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Linha e forma

Harry Callahan "Providence" (1977)

terça-feira, 1 de junho de 2010

O barrete (one size fits all)

Marco Martins é o maior barrete do cinema português. Ou melhor, talvez não seja o maior, mas antes um daqueles de tamanho único, que dá para todas as cabeças, que servem a todos. Porque, com a capacidade que o homem já provou ter de se projectar (a maneira como soube rentabilizar o fenómeno, à nossa escala, que foi Alice, foi, e ainda é, brilhante) e, não menos importante, de saber estar onde o "momentum" está, augura-se-lhe longa e próspera carreira a tentar enfiar o barrete nas cabeças ainda descobertas. Mas atenção que não considero que essa seja uma condição de alguém despojado de mérito, não senhor. Porque o homem sabe filmar e fá-lo como ninguém neste país. São imagens belíssimas, que o olho mais incauto poderá facilmente confundir com cinema, mas que não são. São na verdade, anúncios à arte de filmar, como aqueles radiosos, de gente gira a falar ao telemóvel/beber uma jola (riscar o que não interessa), que ele tão bem produz, ou seja, coisa bem diferente. Porque cada plano no seu cinema (belíssimo, nunca é de mais referir) não é um meio, um caminho, não existe para servir uma estória, para servir os personagens (personagens? mas quais personagens? só porque há um guião escrito não quer dizer que existam personagens, existem, isso sim, bons actores, um extra precioso). Cada plano é um fim em si mesmo, o que o torna numa imagem lindíssima mas plana, inerte, desapossada de qualquer conteúdo, tão vazia como a cadeira onde me vou sentar a cada novo filme seu.